O tríptico que se apresenta faz parte de uma série de pinturas executadas com recurso ao café. Do abstrato ao figurativo, as pinturas que resultaram em flores mais ou menos manifestas servem para despontar e fazer pensar. O título remonta à década do meu nascimento, porque o cantautor brasileiro Geraldo Vandré compôs, na época, uma canção homónima que se tornou num hino de resistência – e por isso foi censurada no Brasil e em Portugal. Por analogia, uma cidade de raiz ecológica precisa de muitas flores mas, ao contrário da letra da canção em que quem resiste são os Homens, na cidade o que resiste são as flores, pelos desmandos dos Homens, que as destroem sem pensar nas consequências, com usos indevidos dos espaços ambientais. Um quadro por ano é a geometria perfeita para, a partir de agora, se alcance, mais além, a mudança das coisas. Como nos tempos do Estado Novo, em que houve cá dentro quem falasse e escrevesse através das metáforas, também na cidade o inconformismo é simbolizado nas flores que do abstrato se afiguraram, e resistem. Neste mês de abril, tal como naqueles tempos da canção, importa haver o mesmo chamamento – “Vem, vamos embora, que esperar não é saber. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Contra a insensibilidade, o desamor e a asnice. – “Caminhando e cantando, e seguindo a canção”.
Jorge Mangorrinha
Abril de 2023
Legenda:
“Tríptico”
Técnica a café sobre toalhas, de mesa, em papel
2021